Mãe taxista
De entre todas as tarefas que me calham por via da maternidade, uma das que gosto mais é a de taxista. Mas sou um taxista à antiga, a minha função é levar e trazer. Se querem aguinhas e biscoitos e conversinhas de chacha, chamem um dos outros mais modernos. Aos poucos vou ganhando os tiques da classe e percebendo o agrado ou desagrado dos meus passageiros.
O maior desagrado é a minha calma inquebrantável com o trânsito. Eles podem estar atrasados mas eu estou no meu papel e não sou paga para me inquietar com essas coisas. O taxímetro tanto funciona depressa como parado. Têm pressa, chamassem o carro mais cedo.
A estação da telefonia também é motivo de alguma tensão. Não é qualquer um que pode mexer na minha companhia ao volante. A pessoa afeiçoa-se às vozes e depois é um sarilho para mudar, nem que estejam horas a falar da problemática dos mineiros no Hemisfério Sul. Em estação sintonizada no primeiro serviço da manhã, já não se mexe o dia inteiro.
Estou tambėm a ficar atenta ao rolar da viatura. O som tranquilo do motor a gasóleo indica estar tudo em ordem. Já os engasganços são um bocadinho humilhantes (está com o ralenti baixo, o meu menino).
E, depois, o ar conformado e paciente que já tenho. Uma mão no volante e outra nas mudanças, na cabeça o próximo serviço e o itinerário favorável, o silêncio que deixa espaço para os clientes interagirem entre si, e só pequenos apontamentos relativos às condições e ao percurso:
- Ora é para a ginasticazinha, certo?
- Não se esqueça de pôr o cinto, se faz favor.
- Está tudo preparado, podemos ir?
- Olha, o animal gosta de passeio! Fique descansada, na volta deixo-o em casa.
- Muito bem, está entregue.
- Tome atenção à porta por favor, pode abrir agora à confiança.
- De nada, às 20:30 h passo a recolher.
Gosto mesmo deste número. Tivesse eu coragem e comprava um kit de bolinhas de madeira, que as costas, como se diz por cá, já se me vão em queixando.
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